A promessa de um emprego para toda a vida se revela como uma sentença de morte da alma em “O Posto” (1961).
No retrato agridoce e minimalista de Ermanno Olmi, a entrada no mundo adulto não é um rito de passagem para a liberdade, mas um lento processo de rendição. Nós acompanhamos o jovem Domenico em sua jornada para conseguir um “posto fixo” em uma grande corporação de Milão e testemunhamos, em pequenos gestos e silêncios devastadores, a erosão de sua juventude. O filme expõe uma crise de masculinidade sutil e profunda, onde o ideal de se tornar um provedor estável se cumpre ao custo da própria identidade, transformando homens em engrenagens anônimas de uma máquina indiferente.
A genialidade de Olmi está em sua recusa ao drama.
A câmera observa Domenico com uma paciência quase documental, capturando a estranheza e a ansiedade de seus primeiros passos no mundo corporativo. Nós o vemos durante os testes de admissão, em sua timidez ao se aproximar da colega Antonietta, em seu deslumbramento cauteloso com a cidade grande. Não há vilões claros, apenas um sistema impessoal e asfixiante. A masculinidade que se espera dele não é a da força ou da coragem, mas a da conformidade, a capacidade de se encaixar sem fazer barulho no labirinto de corredores e hierarquias da empresa.
A própria corporação se torna a antagonista silenciosa do filme. Os escritórios são espaços desoladores, preenchidos pelo zumbido constante de máquinas e pelo som de papéis sendo carimbados. Os funcionários mais velhos que nós encontramos são figuras tristes, homens que abdicaram de qualquer paixão em troca da segurança de um salário no fim do mês. Eles representam o futuro de Domenico.
A breve e tenra conexão que ele estabelece com Antonietta funciona como o último sopro de vida e possibilidade. Seus passeios por Milão são momentos de genuína descoberta, uma alternativa humana e espontânea à rigidez do escritório. A eventual perda desse contato, quando ambos são absorvidos em diferentes departamentos, simboliza a vitória final da máquina sobre o indivíduo.
A cena final do filme é uma das mais desoladoras da história do cinema. Domenico finalmente consegue a mesa que tanto esperava, o posto de um funcionário que acabou de falecer.
Ele não está começando uma vida, está ocupando o lugar de um homem morto, herdando sua cadeira e seu destino. A câmera se fixa em seu rosto enquanto o som de um mimeógrafo cresce até se tornar ensurdecedor, um ruído mecânico e repetitivo que é a trilha sonora do resto de sua vida. Ele conseguiu o emprego, cumpriu a expectativa social, se tornou “homem”. Mas nós o vemos como uma figura tragicamente diminuída, um jovem cuja luz foi permanentemente apagada.
“O Posto” permanece dolorosamente atual porque sua crítica transcende a Itália do milagre econômico.
Olmi nos mostra que a verdadeira crise não está no fracasso, mas em um tipo específico e terrível de sucesso. É a crise do homem que aceita a segurança como substituta da paixão, que troca o sonho pela rotina. É o retrato de uma masculinidade construída sobre a anulação do espírito, uma lição silenciosa e poderosa sobre o preço que pagamos para simplesmente nos encaixarmos no mundo.